quinta-feira, 1 de abril de 2010

à portuguesa

Na noite de 8 Thermidor (26 de Julho) do ano II (1794) Maximilien Robespierre dirigiu-se ao Clube dos Jacobinos de Paris, que frequentava assiduamente, e discursou sob uma chuva unânime de aplausos. A essa unanimidade falharam Billaud-Varenne e Collot d’Herbois, jaconinos influentes e seus colegas no temível Comité de Salvação Pública, que, embora presentes na reunião, foram apupados e expulsos com brados e gritos de «À guilhotina! À guilhotina!» por se terem incompatibilizado com o Incorruptível. Nesse dia, como em todos os outros do passado, Maximilien Robespierre era a inspiração, a referência maior, o líder incontestado dos jacobinos.

Na manhã daquele dia, Robespierre sofrera uma derrota amarga na Convenção: parte da Montanha hostilizara-o e negara-lhe o apoio habitual. No cerne da questão, o temor sentido por quase todos (e que Fouché, sobre quem escreverei por um destes dias, se dedicara a atiçar) de poderem figurar na próxima lista para o patíbulo que Rosbespierre e Saint-Just estavam a preparar. Nessa manhã, lendo um discurso que não mostrara a ninguém, o chefe jacobino cometeu um erro que lhe seria fatal: não nomeou os seus inimigos, tendo ficado por acusações gerais, sem destinatários concretos. Consequentemente, todos os convencionais recearam figurar nessa lista, como Fouché lhes garantira nas horas dos dias anteriores.

No dia seguinte, a 9 Thermidor (27 de Julho), Robespierre perderia o seu poder na Convenção, perante a qual tentou falar por onze vezes e por onze vezes foi eficazmente silenciado pelos seus adversários. Preso, acabou por conseguir refugiar-se no Hôtel de Ville, a Câmara Municipal de Paris, numa sala ironicamente baptizada de Sala Egalité, onde aguardava o auxílio de François Hanriot, que chefiava a Guarda Nacional. Só que Hanriot apreciava mais as virtudes do álcool às virtudes da disciplina militar, e, após ter esboçado uma resistência incapaz (durante a qual vociferou que guilhotinaria as cabeças dos «trezentos criminosos com assento na Convenção»), deixou-se também surpreender pelos gendarmes de Barras, que irromperam na Sala Egalité. Entre eles o soldado Merda, que terá acertado um tiro nos maxilares de Robespierre, prostrando-o e quebrando-lhe os derradeiros e já muito frágeis ímpetos de resistência. Todos os presentes foram presos, com excepção de Hanriot, que se precipitou pela janela e veio a cair sobre um monte de esterco (provavelmente influenciado pelo gendarme que visara Robespierre...) donde o retiraram no dia seguinte, ainda adormecido e a ressacar, directamente para a guilhotina na companhia dos outros jacobinos depostos.

A 11 Thermidor, um dia após a morte de Robespierre e nem três dias completos sobre o se último e aplaudido discurso perante os jacobinos, o mesmo Clube dos Jacobinos de Paris lavrava uma acta da reunião do dia, da qual vale a pena ler algumas passagens sobre o chefe deposto e já morto:

«Porque o celerado que, em conluio com os seus covardes cúmplices, colocou a República a dois dedos da sua perdição não foi desmascarado antes? (...) É porque a máscara de que ele estava coberto era quase impenetrável; (...) Quem podia despertar a suspeita? Acreditava-se que esse monstro fosse inacessível à sede do outro e o seu despotismo era olhado como a autoridade de um republicano sincero. A máscara caiu, Catalina não existe mais.»

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